Carta que Gislene enviou para Dani... sobrou pra mim entregar, eheheheh

Oi meu filhinho amado!
Sabe mamãe te ama demais (eu sei que vc sabe disso).
Mamãe quer que você saiba que você sempre e sempre vai estar no meu coração!
Não quero te mentir e dizer que estou bem, porque eu às vezes (quase sempre) fico muito triste, dói demais meu coração, mas a mamãe continua tentando por você!
Eu não quero ver você triste, meu lindo amado, também não quero que você pense nunca que eu sofro e que você é o culpado, você não é o culpado, não sei quem é, mas você nunca foi culpado, você foi o que de melhor aconteceu em minha vida.
Eu sei que você escuta tudo que eu te falo, converso sempre com você e sei que você sabe de tudo, mas o tio Leo pediu para eu escrever essa cartinha para você, então estou escrevendo!!!
Amo você meu anjinho, por favor, quando você puder atende o meu pedido!!!
Te amo minha vida, meu anjinho lindo, razão da minha vida!
Mamãe

Este é o bilhete que estou levando para Daniel de Gislene; a noite está escura, e a trilha está perigosa, depois de três dias de chuvas intensas... Sempre que subo esta montanha seja qual hora for, me sinto como se isto fosse a primeira vez... talvez porque eu saiba da expectativa das Mães, em relação a obterem notícias de seus filhos...
Mas devo confessar é uma escalada muito difícil cheia de cobras enormes e venenosas..., e aranhas e escorpiões, em razão disto tento não andar muito rapidamente e, também não ficar me esfregando nas laterais da trilha, já que a trilha é bem estreita...
Andar à noite então o perigo é dobrado, porque a maioria dos animais se alimentam de noite e, eu não quero ser refeição de ninguém... ehehehe
- Ei, Caminhante, pegue esta bengala e use-a se uma onça aparecer... não vai matá-la mas assusta...
- Mas eu nunca vi onça por aqui de onde será que apareceu esta onça... e quem é voce?
- Meu nome é Daniel filho de Carolina e, hoje eu sou responsável pela harmonia da montanha durante esta noite inteirinha...
- Interessante isto Daniel eu tenho um recado...
- Eu sei, é para o pequeno Dani... hoje estou muito atarefado mas se você puder dizer pra minha Mãe que está tudo bem e, em paz e que ela pode ficar despreocupada eu agradeço muito caminhante.
- Ok Daniel, eu dou o recado sim...
- Sabe caminhante, eu estou por aqui há alguns anos e, a comunicação é difícil, explica isto pra ela não pensar que não ligo pra ela, eu sinto a falta, mas minha vida agora é esta aqui e, à medida que o tempo passa menos eu consigo recordar das coisas do mundo apenas de minha mãe, e família...

Então segui em frente, buscando pelo pequeno Dani pra entregar a cartinha de Gislene... e, por precaução a vara, eu a levava apontando bem na frente. Para não ter surpresa com a tal onça...
Repentinamente vejo uma coisa escura contando um dois três e já... e, no já eu enfiei a vara cotucando firme aquela coisa escura que parecia um monte...
- Ahaaaaaaaaaaaa!! Ahaaaaaa!!!!!!!! ahaa!!!!!!!!!

E a coisa gritava e pulava na escuridão querendo vir pra cima de mim...
- Sai daqui coisa do inferno, o que você ta fazendo aqui? Vai cotucar tua mãe....
- Calma senhora! calma!
- Calma? você enfia a vara na minha bunda e ainda pede calma?
- Mas!!!!!
_ Mas nada, seu ser inconseqüente, estou aqui brincando de esconde esconde com o pequeno Daniel e você vem com violência pra cima de mim, não viu que eu estava “batendo cara”?
- Mas senhora está meio escuro e...
- Se estivesse escuro total mesmo você tinha atravessado esta vara em mim, então?

Nossa a mulher ficou possessa e gritava e falava, enquanto eu apenas ouvia, porque não adiantava falar nada...
Depois de 15 minutos ela acalmou... e parece que ficou cansada, sentou-se numa pedra sob a luz da Lua e ficou imóvel, daí sob o luar eu a reconheci como sendo Evanilde Ramos desencarnada em 22 de maio de 2005..., Mãe de Adriana...
Embora eu precisasse de um recado dela para a filha, fiquei meio relutante de falar com ela, porque nossa havia enfiado a vara, na mulher. Que vergonha!!
- Oi tio!... tá tudo legal com você???
- Pequeno Dani, não fale com este monstro que anda com uma vara na mão!!! ele é perigoso... vem aqui com a vovó, vem meu bem...
- Vovó? A Cecilia é avó dele...
- Cale-se, oxente! enquanto eu estiver aqui eu sou a vó dele entendeu? E pode ir descendo...
- Não vó ele traz bilhete de minha mãe pra mim... o Dani Grande me falou... ele é o mensageiro Caminhante...
- Vá lá seu Caminhante, mas largue esta vara infeliz e cuidado com o que fala pra o menino...

Entrego o bilhete de Gislene para o pequeno Dani... ele sorri muito, abre a carta, e cheira...
- Tem o cheiro da mamãe! É gostoso!!

Então, ele pega a carta e aperta ela contra o peito e eu pergunto: por que você está fazendo isto Dani?...
- É pra mamãe falar dentro do meu coração, igual ela fala todo dia...
- E, você gosta quando ela fala com você?
- Eu gosto, só não gosto quando ela vai no cemitério e chora eu não gosto de lá... eu tenho medo de perder ela lá... eu gosto quando ela fala comigo da minha casa...

Então eu caminho em direção de Evanilde e quando estou há alguns passos dela ela dá um sorriso grande e grita como se gritasse para o mundo saber,
- É brincadeira caminhante!!... e você ficou assustado comigo não foi? Eheheheh
- Fiquei sim...
- Pois olha uma coisa, meu amigo, eu nunca perderia a oportunidade de falar com minha filha nem que isto fosse a ultima coisa que eu tivesse que fazer... Você não imagina como é especial aquela minha filha, não é porque seja minha filha não, mas é linda, é um amor, é o meu amor que eu deixei lá... e agora espero que ela consiga realizar o sonho dela, e eu fico muito feliz e vou fazer muita festa por aqui pra comemorar... Caminhante tenho pouco tempo agora, meu amigo, mas precisamos conversar outro dia...
- Tio, abaixa aqui...

Então eu abaixo e Dani me beija no rosto enquanto acaricia a barba e diz:
- Manda um beijo no meu pai... eu lembro de quando mexia no rosto dele...

Então ele me abraça e aperta com força, e diz:
- Dá este abraço pra minha mãe... é assim que eu gosto de abraçar ela porque sinto meu coração perto do coração dela...
Tio dá tchau né!

Eu não conseguia falar, porque o abraço foi sufocante e revigorante, é tudo o que eu pude sentir, e com dificuldade de enxergar o caminho eu tentava secar as lágrimas que insistiam em cair...
Muita emoção para o coração de um velho caminhante que vive de levar e trazer mensagens entre os dois mundos...
Não sei qual é minha profissão ao certo... sei que posso fazer de tudo, mas talvez o que eu faça melhor é caminhar...
Não tenho palavras, pra descrever mais nada, apenas que o mundo não é como as pessoas julgam ser... pois um abraço de um pequenino ser pode ser mais forte, que a própria vida.

Léo 26/09/2009